terça-feira, 10 de abril de 2012

A opressão da mulher trabalhadora

A opressão da mulher trabalhadora como experiência
de classe: da formalidade da lei a debilidade das políticas públicas.

Anézia Viero[1]
Fabiana Sanguiné[2]
Sonia
Ribas de Souza Soares[3]
"O
proletariado não pode atingir a liberdade completa sem conquistar a plena
liberdade para a mulher".
Lênin
Resumo: Este artigo discute a opressão da
mulher trabalhadora na EJA como experiência de classe, as políticas de combate
a opressão da mulher no Estado Brasileiro no governo atual. Na sociedade
brasileira a opressão da mulher possibilita dupla exploração no momento que
exercem no plano público, seu trabalho produtivo e no universo da vida privada
consome horas no trabalho doméstico, contribuindo para reprodução do capital. O sistema capitalista oportunisticamente
aproveita-se da naturalização dos aspectos culturais que coloca a mulher como sendo capaz de melhor suportar
sacrifícios, ao mesmo tempo que a
diferenças salariais entre homens e mulheres expressam a desvalorização das
tarefas “femininas”, mesmo para trabalhos iguais. As conquistas femininas ainda não são
asseguradas em todos os países, e mesmo onde são a formalidade da lei leva a
uma fragilidade das políticas públicas contra a opressão da mulher.
Palavras-chave:
opressão, experiência de classe, mulher
1.
Introdução
Este artigo busca
discutir a opressão da mulher trabalhadora como experiência de classe, as
políticas voltadas ao combate à opressão da mulher no Estado Brasileiro no
governo atual.
Partimos
da concepção materialista da história, a partir do ponto de vista da mulher
trabalhadora, classista, presente no “mercado de trabalho” que lutam pela
sobrevivência, relutando e questionando os privilégios que reforçam todo tipo
de opressão por meio da busca pela sua formação. O capitalismo, ao revolucionar
as forças produtivas utiliza-se da opressão da Mulher, culturalmente anterior a
esse sistema, para explorar ainda mais as mulheres da classe trabalhadora, por
isso a da opressão da mulher não se resume a um problemas de gênero.
Segundo Toledo (2008,
15) tratar da opressão da mulher como um problema de gênero tem como
conseqüência a luta por políticas de gênero fora do marco da luta geral da
classe trabalhadora, sendo luta pela conquista do poder político que não deixa
claro contra quem se luta. Ou seja, ignora-se o vínculo indissolúvel da
opressão da mulher trabalhadora ao capitalismo e, portanto, o vínculo
indissolúvel que existe entre a luta por superar a opressão e a luta pelo socialismo.
A opressão da mulher como um fator cultural assume diversas
formas segundo o grau de desenvolvimento das forças produtivas e das relações
de produção em cada lugar e em cada período histórico. Por isso extrapola os
marcos individuais e a questão de gênero e engloba toda a sociedade, visto que sua
submissão tem o poder de impedir a emancipação de toda a humanidade e não
apenas de uma parte dela.
Singularidade da
opressão da mulher na sociedade capitalista, entre todas as demais formas de
opressão, atinge mais da metade de toda a espécie humana (52% da população
mundial é feminina). Em graus e intensidade diferentes, a opressão atinge
burguesas e trabalhadoras. Dentro da classe trabalhadora, a mulher negra é
aquela que concentra o mais alto grau de opressão: por ser negra, mulher e
trabalhadora.
A dupla jornada de
trabalho da mulher é uma das formas mais gritantes da relação entre a opressão
e exploração da mulher trabalhadora, pois o trabalho doméstico consome horas da
mulher no universo da vida privada junto com o trabalho no plano público.
Outro
fator a ser considerado é o papel da mulher, como “objeto” por meio das várias
formas de mercantilização do corpo. Para
Gramsci (1984) a ação da ideologia burguesa sobre a mulher constrói um ideal
‘estético’ masculino sobre a mulher, no qual a sexualidade vira um esporte e a
mulher é um tipo de brinquedo de lazer. O ideal ‘estético’ da mulher oscila
entre a concepção de “procriadora” e de “brinquedo”. Essa concepção para o
autor faz parte da formação de um “novo homem” adaptado ao projeto burguês de
sociedade em que a hegemonia do processo de produção da fábrica é o parâmetro
para toda a sociedade e a formação da “personalidade feminina” é necessária
para consolidar essa hegemonia. Por conseguinte a regularização da prática
sexual do trabalhador tem a função de não desperdiçar suas energias nervosas
para não produzir “estafa” ou “exaustão” junto com a disciplina de seus
movimentos. É por meio da monogamia apoiada no puritanismo que a sociedade
burguesa educa os trabalhadores e as trabalhadoras para os hábitos necessários
à extração de mais-valia da classe trabalhadora.
Esses são aspectos que
naturalizam a violência contra a mulher no Brasil, retratada nos dados que
apontam que a cada quatro minutos uma mulher é estuprada, onde a própria casa é
o lugar mais perigoso.[4]
É
nesta realidade da mulher que o capitalismo exerce alguns dos mais perversos
mecanismos de opressão. Através de suas instituições e ideologias patriarcais -
entre as quais se destaca o papel repressor das Igrejas – que contribui para perpetuar
na consciência da humanidade ideologias geradoras de leis, moral e
comportamentos que anulam a mulher como ser consciente de si mesmo. No Brasil a
presidenta mulher por meio da “Carta ao
Povo de Deus” ao atender o apelo dos parlamentares da bancada evangélica,
retirando do seu programa a legalização do aborto, transforma em moeda de troca
uma bandeira histórica de luta das mulheres, numa realidade onde há um alto
índice de mortalidade e complicações devido às intervenções clandestinas sem
condições adequadas.
É
a cultura patriarcal que alicerça as ideologias machistas que serve aos
interesses do sistema no sentido de reproduzir gratuitamente sua mão-de-obra e
superexplorar à metade tida como “inferior”. A ideologia machista se traduz em:
superioridade dos indivíduos do sexo masculino;
função meramente reprodutora do sexo; negação do prazer sexual da
mulher; obrigação feminina de ter
filhos; família patriarcal como “célula mater” da sociedade; propensão
“natural” da mulher para a vida doméstica; incompatibilidade entre o trabalho
feminino e a maternidade, entre outros.
É
por meio da cultura patriarcal
que as características fisiológicas da mulher, passaram a ser utilizadas contra
ela colocando-a como inferior, mesmo na sociedade burguesa onde o avanço das
forças produtivas proporcionam processos de trabalho que não exigem força
física. Contudo o princípio burguês da igualdade formal dos indivíduos perante
a lei permite que as divisões sociais sejam naturalizadas em desigualdades
postas como inferioridades naturais. Dessa forma há um esvaziamento da gênese
histórica da desigualdade permitindo assim a naturalização de todas as formas
visíveis e invisíveis de violência, pois estas não são percebidas como tais(CHAUÍ.2001,
p. 90).
A
relação entre opressão e exploração expressa-se como duas categorias desiguais
e combinadas que embora
se combinem, são distintas. Pois a opressão atinge todas as mulheres,
envolvendo o seu desenvolvimento profissional, direito ao trabalho, sua
liberdade para decidir sobre a sua vida e dispor de seu próprio corpo, sendo cultural e social, gera uma
situação de discriminação que atinge mulheres de diversas classes sociais e
pode ter efeitos econômicos de maior ou menor peso. Já a exploração atinge a
mulher trabalhadora de forma historicamente específica, em especial na
sociedade de classes, a exploração é uma forma de acumulação de capital e nesse
sentido a opressão
é utilizada pela classe dominante para explorar ainda mais a classe
trabalhadora. É exatamente esse conceito que explica porque os setores
oprimidos sejam a parcela da classe trabalhadora mais explorada e que o
machismo é experimentado de maneira quantitativamente e qualitativamente
diferente por mulheres de classes diferentes
2 A opressão da
mulher trabalhadora no capitalismo.
No
capitalismo, a opressão - exploração se manifesta de várias formas: a
reprodução e manutenção da força de trabalho, através do trabalho doméstico não
remunerado, e a utilização da mão-de-obra feminina por salários mais baixos,
propiciando maior extração de mais-valia. As conquistas
femininas: direito ao voto, legalização do aborto e do divórcio, leis que punem
a discriminação no trabalho e na vida social e o abuso sexual praticado pelos
homens, ainda não são exercidas em todos os países e mesmo onde são asseguradas
pela lei, estão sempre ameaçadas.
A flexibilidade do capitalismo em se reestruturar
para gerar suas próprias crises se expressa em aproveitar em benefício próprio
toda a opressão que esteja histórica e culturalmente disponível, como é o caso
do machismo, que esconde a realidade estrutural do sistema capitalista e divide
a classe trabalhadora no momento que garante vantagens para parcelas dos
trabalhadores no mercado de trabalho. Por conseguinte as práticas de opressão mascaram a ordem
estrutural do sistema capitalista colocando trabalhadores e trabalhadoras em
competição entre si.
Contraditoriamente
o capitalismo tem uma tendência em diluir identidades, no momento que absorve
as pessoas no mercado de trabalho, reduzindo-as em mercadorias. Nesse sentido
há uma indiferença estrutural em relação às identidades específicas no momento
que transforma pessoas em unidades intercambiáveis de trabalho. Ao mesmo tempo
que sua história é marcada pelos mais violentos machismos, visto que aproveita-se
das opressões com base nas identidades específicas para intensificar a extração
de mais-valia. As formas de opressão existem, mas ao situar no contexto
material e histórico possibilita destacar mecanismos discriminatórios variados
que são fundamentais para o capitalismo, como sistema ( STABILE. 1999, p.
145-160).
Encontramos na análise de Marx, dados que apontam
como a sociedade industrial capitalista absorve as opressões como forma de
maximizar a exploração da classe trabalhadora. Segundo Marx (1996, p. 550-575)
a indústria capitalista reproduz a divisão do trabalho de maneira mais
monstruosa das formações sociais anteriores. Na fábrica capitalista
transforma-se o trabalhador no acessório consciente de uma máquina, e, fora
dela, por toda a parte, com o trabalho das mulheres, das crianças e dos
trabalhadores sem habilitação servem de nova base à divisão do trabalho.
No capitalismo atual, intensifica-se a exploração da
mulher, visto que por um lado elas se inserem no mercado de trabalho, por outro
continua realizando o trabalho doméstico que garante a reprodução da força de
trabalho necessária ao sistema.
Os dados apontam que a participação das mulheres no mercado de trabalho
não reduziu a jornada delas com os afazeres domésticos. Segundo IBGE/PNAD 2001 e 2005 na faixa etária
de 25 a 49 anos de idade o trabalho doméstico ocupa 94,0% das mulheres. No
Brasil 109,2 milhões de pessoas de 10 anos ou mais de idade declararam realizar
tarefas domésticas; sendo que, deste conjunto, 71,5 milhões (65,4%) são
mulheres e 37,7 milhões (34,6%) são homens.
Desde a infância, o trabalho doméstico está relacionado a uma atividade
feminina. Em 2005, cerca de 83% das
meninas, de 10 a 17 anos de idade, realizaram tais afazeres, enquanto que entre
os meninos nesta mesma faixa etária a proporção foi de 47,4%. O tempo
despendido nessas atividades diferencia significativamente entre os sexos:
meninos 8,2 e meninas, 14,3 horas semanais.
Considerando a jornada do trabalho produtivo mais os
afazeres domésticos nos cinco dias úteis da semana, as mulheres, em média,
trabalham 11,5 horas por dia contra 10,6 horas para os homens.
Ao relacionar a dupla jornada, com a indistinção
cada vez maior da vida pública e privada o trabalho doméstico torna-se cada vez
mais mercadoria num sentido mais profundo, destacando-se o emprego doméstico.
Segundo dados do IBGE/2007, existem 6 milhões de brasileiras no desempenho
da função de domética, na sua maioria
mulheres negras, que recebem em média o salário mínimo. O número, porém, se
refere àquelas trabalhadoras com visibilidade no mercado, pois segundo dados do
IBGE, apenas 25% das trabalhadoras
têm carteira assinada. Porém dados do Departamento de Qualificação do
Ministério do Trabalho pode haver mais 2 milhões de pessoas não contabilizadas,
trabalhando em residências. São crianças e jovens que passam por afilhadas,
sobrinhas, mas que, na realidade, arrumam, lavam, cozinham e sofrem
humilhações.
Segundo pesquisa da Federação Nacional das
Trabalhadoras Domésticas (Fenatrad), estima-se que no Brasil existam cerca de 500 mil crianças e
adolescentes trabalhando de forma irregular no cenário doméstico. As meninas são as
mais exploradas. O perfil dessas crianças e adolescentes
trabalhadoras domésticas no Brasil é quase sempre o mesmo: 93% são meninas e
mais de 60% são negras.
As pesquisas de
Antunes(2001, 108) mostram que o trabalho feminino no mundo fabril tem
desenhado uma nova divisão sexual do trabalho. O trabalho feminino tem sido
reservado as áreas de trabalho intensivo, com níveis ainda mais intensificados
de exploração, sendo o trabalho mais precarizado reservado as mulheres. Com
o regime de part-time, marcado por
uma informalidade ainda mais forte, os desníveis salariais entre homens e
mulheres continuam acentuados. Nesse sentido, no
universo do mundo produtivo e reprodutivo a divisão sexual do trabalho
possibilita que os capitalistas se apropriem do trabalho de forma desigual,
beneficiando-se.
Segundo pesquisa
realizada via Internet com 300.000 mulheres, de 24 países, publicada em 2009 –
(Des)igualdade de gênero no mercado de trabalho - Confederação Internacional
dos Sindicatos (ITUC/CSI), as mulheres
ganham em média 22% a menos que os homens, sendo que as trabalhadoras
brasileiras são as que sofrem com uma diferença salarial em relação aos homens
com diferença de 38,8% entre o salário dos homens e mulheres.
Esses dados
exemplificam como a opressão da mulher culturalmente anterior ao capitalismo intensifica a exploração das
trabalhadoras, visto que elas exercem no plano público, seu trabalho produtivo
e no universo da vida privada consomem horas no trabalho doméstico,
possibilitando a reprodução do capital, mesmo na esfera do trabalho não
diretamente mercantil. Por conseguinte o trabalho doméstico cria as condições
indispensáveis para a reprodução da força de trabalho dos maridos, filhos e de
si própria.
3. A origem da
opressão da mulher trabalhadora.
A história do
marxismo é marcada pela luta contra concepção de que as “mulheres são por
natureza inferiores”, colocando a opressão desde um fundamento social e
histórico.
É no “lar” que
se reproduz a ideologia da sociedade burguesa patriarcal, onde toda criança
nasce aprendendo a respeitar “a autoridade paterna” e ver na mulher um ser
destinado a servir os demais, em todos os sentidos. Esta ideologia vem
justificando uma desigualdade dos sexos e uma posição degradante das mulheres
desde o surgimento de formas mais ou menos estruturais de exploração dos seres
humanos.
Estudos
antropológicos demonstram que em sociedades primordiais (período que compreende
cerca de 90% da historia da humanidade) quando ainda não existia a propriedade
privada sobre os meios de produção, o conceito de masculino / feminino e os
papeis sociais eram diferenciados da lógica dos recentes 6000 anos de história
“oficiail”.
Milhares de
achados arqueológicos dão conta de que as mulheres chegaram, inclusive, a serem
consideradas deusas num mundo onde a procriação e o fato de um corpo possuir o
alimento necessário para a sobrevivência da espécie era reverenciado por seu
valor material/mágico.
Engels,(1980, 56)
entre outros, demonstrou como a opressão
sexual/política das mulheres surgiu com a apropriação individual do trabalho
coletivo (sociedade de classes). Nas sociedades primordiais, além das mulheres
serem consideradas seres dotados de atribuições físicas que permitiam a
perpetuação da espécie, o modelo de família era completamente diferente. A
liberdade sexual e a possibilidade de relacionamentos livres vinham
acompanhados da linhagem matrilinear. As comunidades eram mães e pais
coletivos.[5]
O excedente de
produção, o fato de que os homens detivessem os instrumentos de guerra (armas
de caça) foi paulatinamente obstruindo a liberdade sexual das mulheres em
função do direito de herança. É o surgimento da herança que instaurará ao longo
dos tempos/lugares um local domesticado e controlado para a perpetuação da
propriedade privada. Os filhos “legítimos”, o controle da natalidade passou,
então, dos ventres das mulheres para os homens senhores da guerra. (Viero,
Colombo 2011)
Segundo Toledo (2008, 29) foi somente com o advento
da indústria que a produção social foi novamente aberta à mulher sem que sua
dominação pelo patriarcado fosse resolvida. No moderno sistema fabril, a
relação familiar não deixou de ser uma relação de poder. As mulheres como
trabalhadoras assalariadas, participam da produção social, do domínio do
trabalho coletivo, e adquirem assim, maior independência diante do homem.
Kolontai (2008, 15) expressa que esse novo momento da mulher adquirindo maior
independência do homem, produz modificações psicológicas, que muitas vezes não
são percebidas, mas que na realidade a sua inserção no mercado de trabalho,
nada mais é, que uma grande reserva de
mão de obra necessária ao capitalismo. A monogamia e o patriarcado não só se
mantiveram como foram agravados com o advento da indústria moderna. Aquele que
poderia ter sido o passo decisivo para a emancipação da mulher – sua entrada na
produção coletiva foi transformado pelo capitalismo em mais uma forma de
opressão e super-exploração da mulher.
A origem da opressão
da mulher esta, portanto, ligada as transformações ocorridas nas relações
humanas desde as primeiras sociedades que se conhece. As descobertas
antropológicas permitem afirmar, que a mulher não nasceu oprimida, mas passou a
sê-lo devido a inúmeros fatores dentro os quais foram decisivos os fatores econômicos,
que determinaram toda a superestrutura de sustentação desta opressão: as
crenças, os valores, os costumes, a cultura em geral. Em especial, a opressão
da mulher esta vinculada a Propriedade privada dos meios de
produção. Esse fato mostra que a opressão só
poderá ser superada com o rompimento total deste modo de organização das
relações sociais.

4. A
opressão das mulheres trabalhadoras no Brasil atual: da formalidade da lei a
debilidade das políticas públicas de combate a opressão.
As políticas
públicas para mulheres dos países semi-coloniais, em especial o Brasil, seguem
as orientações do imperialismo. Na medida que o Banco Mundial financia projetos
sociais, impõe aos governos a perspectiva de políticas focalizadas e
compensatórias para aliviar as possíveis tensões decorrentes da contenção de
despesas públicas na área social. Ao
seguir a cartilha do Banco Mundial o governo, implementa políticas compensatórias
na linha da economia de recursos para políticas sociais, a exemplo do corte de
50 milhões do orçamento do governo Dilma
que atingiu as várias áreas sociais.
Os programas de transferência de renda, em especial para o Brasil, foram
acompanhados de condições a serem implementadas. Estas foram apresentadas em
diversos documentos, discursos e entrevistas, e representam um retrocesso em
relação a conquista dos direitos sociais, pois são fundamentadas no Estatuto da
superação da pobreza e as mulheres são as responsáveis pela sua implementação.
Na década de
1970 as pesquisas apontam para a “feminização da pobreza,” ou seja, as mulheres
vêm se tornando, ao longo do tempo, mais pobres do que os homens. O Relatório
do Desenvolvimento Humano 1995 constatava que “a pobreza tem o rosto de uma
mulher”.
Nas décadas de
90 e primeira década de 2000, a mulher passou a ser imprescindível para a noção
de sustentabilidade do BM. Isso se expressa nas Conferência Educacionais que tiram diretrizes
para a educação mundial. A Conferência de Nova Delhi, realizada em 1993 enfatiza a importância da escolaridade feminina e sua participação
crescente no mercado de trabalho. Essas diretrizes são incorporadas no Brasil
pelos Planos Decenais das décadas de 90 e 2000, que enfatizam a produtividade
da mulher por meio aumento da escolaridade. Contudo é destinada a mulher
trabalhadora uma escolaridade aligeirada
e a baixo custo, implicando no rebaixamento da aspiração profissional,
limitando a expectativa da mulher aos
setores de trabalho mais precarizados.
Nessas mesmas
décadas se consolidam as políticas públicas com base na perspectiva de gênero,
as mesmas voltam-se para empoderamento das mulheres, por meio de programas
voltados a aumentar a auto-confiança das mulheres.
O Programa da
presidenta do Brasil, eleita em 2011, expressa a perspectiva do empoderamento das mulheres, configurando-se no aumento da presença
feminina nos ministérios. No Brasil não é um fato menor, pois segundo pesquisa
da Fundação Perseu Abramo, por ano, mais de um milhão de mulheres são vítimas
de violência doméstica. A cada três minutos, uma mulher sofre agressão física:
a maior causa de invalidez de mulheres entre 16 e 44 anos é a violência
doméstica. Dez mulheres são assassinadas por dia, e 70% dos agressores são
maridos, companheiros ou ex-companheiros. Um em cada cinco dias de trabalho
perdidos pelas mulheres decorre de algum problema de saúde causado por
violência doméstica.
Todavia
o projeto de empoderamento da presidenta
expressa a face feminina do
projeto de conciliação de classes, que atende as perspectivas do Banco Mundial. Nesse sentido uma mulher por ser mulher não combaterá
a opressão da mulher com um projeto de
Conciliação de classe. Ao contrário coloca de maneira distorcida o sentimento e
a esperança de ver mudanças, pois ao não
ter um projeto que atenda a classe trabalhadora não enfrenta o Estado opressor,
logo não enfrenta a situação de opressão da mulher e, ao criar programas focalizados para
mulheres pobres, que não resolvem a situação estrutural, atribui
à pessoa que se encontra em situação de pobreza a responsabilidade de superá-la
e as políticas publicas de combate a opressão não passam de formalidade.
O Plano Nacional de
Enfrentamento à violência contra às Mulheres elaborado a partir do Plano
Nacional para Proteção para as Mulheres (PNPM), formulado com base na I
Conferência Nacional de Políticas para às Mulheres, realizado em 2004, pela
Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres (SPM-criada em janeiro de
2003, com estatus de Ministério) e pelo Conselho Nacional de Direitos da
Mulher, foi formulado ainda no primeiro
governo Lula tem o objetivo sistematizar as políticas públicas de enfrentamento
à violência contra a mulher e a atuação do Estado brasileiro neste sentido.
De 1985-2002 o eixo da política de proteção à Mulher vítima
de violência era basicamente a instituição de delegacias especiais para
mulheres e casas-abrigo de proteção à mulher em situação de risco de morte.
A Lei 10.778\2003 estabelece
a notificação compulsória nos sistemas
de saúde, pela rede Infoseg (rede nacional de informações que integra o sistema
de Segurança Pública, Justiça e Fiscalização).
A
formalidade da Lei Maria da Penha (11.340/2006) que sem eu texto tem como
propósito caracterizar a violência doméstica e familiar como violação dos
direitos humanos da mulher e garantir proteção e procedimentos policiais e
judiciais para as vítimas, a criação do sistema nacional
de dados estatísticos sobre a violência doméstica e familiar contra a mulher, criminalizando
a violência contra a mulher, prevê a criação de juizado especial para julgar os
casos de violência contra a mulher, classifica os tipos de violência doméstica em
física, sexual, psicológica, patrimonial ou moral, passa a ser proibida a
aplicação de leis pecuniárias aos agressores e a penalidade que não passaria de
um ano pode agora chegar a três anos de prisão dando-se encaminhamento às
mulheres e seus dependentes aos serviços de proteção social.
Embora
essa lei contribua para desnaturalizar a violência doméstica e familiar que
garante a supremacia masculina e a subordinação feminina, não prevê gastos para
a sua implantação e não havendo determinação de
investimento público e nem direcionamento do orçamento para a aplicação de
políticas de prevenção (âmbito educacional, cultural, social, saúde e estrutural
da mão-de-obra feminina), assim como de políticas punitivas aos agressores,
pode-se dizer que a lei não passa de mera formalidade, já que as ações do Estado
não passam da criação de poucas delegacias especializadas, mas sem nenhuma
articulação de fato entre os sistemas de saúde, de segurança e de assistência
as vítimas e seus dependentes para proteger a vida e prevenir futuras
violências.
Uma outra face
da violência do Estado contra a mulher é a criminalização do aborto. A lei que
proíbe o aborto é reafirmada no governo de uma mulher. Com a carta ao povo de Deus, dirigido ao publico
religioso, Dilma reafirmou a criminalização do aborto, ignorando inúmeras
mulheres que morrem todos os dias
vítimas de procedimentos mal sucedidos. De acordo com a pesquisa Nacional de
Aborto uma em cada 7 mulheres até
quarenta anos realizaram aborto. Metade delas recorreram ao sistema de saúde e
foram internadas por complicações, além do aborto clandestino estar entre as
principais causas de morte de mulheres no Brasil, principalmente as mulheres
pertencentes a classe trabalhadora, que não tem condições de ir a uma clinica
clandestina, além disso o negócio do aborto é um dos mais lucrativos.
Outra
face da opressão do Estado é a negação dos
direitos básicos às mulheres como: o direito à maternidade quando a
licença-maternidade de seis meses não vale para todas, o não acesso a educação das crianças de 0 a 6 anos, para que as mães possam
trabalhar e estudar. Os dados oficiais apontam que no Brasil, o atendimento de
0a 6 anos está entre 10 a 16%. Isso significa que mais de 80% das crianças não
tem acesso a creches.
Ao mesmo que o
governo Dilma reforça as políticas focalizadas como o bolsa família para resolver a defasagem de vagas nas Creches públicas, corta 3
bilhões de Reais do orçamento destinado a educação. As políticas de bolsas para
a educação de 0 a 6 anos surgem na primeira década de 2000 obedecendo a lógica do
Banco Mundial expressa nas políticas do MEC, que cria incentivos por meio de bolsa
para as mães cuidarem de seus filhos de até 3 anos de idade fora das creches,
jogando para as mães a responsabilidade da educação infantil, reafirmando a
naturalização do papel da mulher como responsável exclusiva da educação dos
filhos, confinando-as como cuidadoras.
Os programas
focalizados são de baixo custo destinado a trabalhadores sob a perspectiva das políticas públicas de combate à pobreza. Desses destaca-se
o Programa Bolsa Família (PBF), implementado durante a presidência de Luis
Inácio Lula da Silva com continuidade na presidência Dilma. É um programa que
fornece transferência de renda às famílias consideradas em situação de extrema
pobreza e responsabiliza as mulheres para o cumprimento de suas condicionantes.
Por esta razão, são as mães de família as titulares que recebem as
transferências monetárias correspondentes, como forma de “dar poder as
mulheres”. Contudo as mulheres não participam dos processos decisórios
relativos à concepção, execução e avaliação do Programa. A responsabilidade do
Estado é substituída pela responsabilidade das mulheres em garantirem a
inserção nos serviços de saúde e educação, num contexto marcado pela
deterioração da educação e da saúde pública em face da retirada dos já poucos
recursos destinados a esses setores.
Neste ano a
presidenta lançou o programa Rede Cegonha, para ampliar o acesso e qualificar a
atenção a saúde da mulher antes durante a após o parto. Para isso prevê um
conjunto de medidas, para a construção de uma rede de cuidados primários ás
mulheres e crianças desde o pré-natal até os dois anos de idade das crianças.
No mesmo momento que a presidenta lança
o programa Rede Cegonha prevendo
investimento de 9. 397 milhões até 2014,
promoveu cortes de 1 bilhão dos recursos destinados a saúde, com a
justificativa de combate a inflação. Ou seja, os dados do governo em relação o
reajuste estrutural, apontam que os objetivos de programas como Rede Cegonha
não passam de formalidade.
O Bolsa Família, o Rede Cegonha e a Lei Maria
da Penha expressam que o governo Dilma
por meio da utilização da mídia fortalece a hegemonia para implementar o Plano
de Ajuste Estrutural que mantém as condições e pobreza por meio da implantação
de políticas voltadas às famílias, em especial para as mulheres, para formar
reserva de mão de obra. Esses programas
não incluem iniciativas estruturais que permitam as beneficiárias superarem a
situação de extrema pobreza em que se encontram. Logo são
programas que expressam a natureza opressora do Estado brasileiro reproduzindo
as experiências de classe das mulheres trabalhadoras.
Referências
ANTUNES, Ricardo. Os sentidos do trabalho: ensaio sobre a afirmação e a negação do
trabalho. São Paulo: Boitempo Editorial, 2001.
BRASIL; Lei 11.340.
Lei
Maria da Penha; 2006
BRASIL.
Ministério da Saúde. Rede cegonha. www.saúde Gov.br Acessado
em 15 de agosto de 2011.
Central
Sindical e Popular Conlutas - CSP Conlutas cspconlutas.org.br/setoriais-de-trabalho/mulheres/
http://www.mulheresemluta.blogspot.com/
Acessado em 15 de agosto de 2011.
CHAUI, Marilena. Brasil: mito fundador e sociedade autoritária.. Editora: Fundação
Perseu Abramo, 2001 (Coleção História do Povo Brasileiro)
COLOMBO, Rose; VIERO, Anezia. Mulheres na história: o silêncio como discurso de dominação, Curso de Opressões PSTU; 2011( texto
digitado)
CONFEDERAÇÃO
INTERNACIONAL DOS SINDICATOS ITUC/CSI: (Des)igualdade
de Gênero no Mercado de Trabalho. In: Encontro das Mulheres Trabalhadoras
em Seguridade Social. Confederação Nacional dos Trabalhadores em Seguridade
Social. www.cntsscut.org.br Acessado em 15 de
agosto de 2011
ENGELS,
Friedrich. A origem da família, da
propriedade privada e do Estado. 6 Ed. Civilização Brasileira 1980.
Fundação
Perseu Abramos; Serviço Social do Comércio - CSC. Mulheres Brasileiras e gênero nos espaços públicos e privados www.fapabramo. Org. BR, acessado em julho de
2011.
GRAMSCI,
Antônio. Maquiavel, a política e o
Estado Moderno. Rio de Janeiro: Civilização Brasileria, 1984.
FONSECA,Marília. O banco Mundial como referencia para a justiça social no terceiro
mundo: evidencias do caso brasileiro Rev. Fac. Educ. vol.24 n.1 São
Paulo Jan./Jun. 1998
CARVALHO MARTINELLI
FREITAS, R.: Programas de Combate à Pobreza: o papel das mulheres,
en Contribuciones a las Ciencias Sociales, agosto 2008, www.eumed.net/rev/cccss/02/rcmf.htm
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA –
IBGE -Comunicação Social. Tempo, trabalho e afazeres domésticos: um
estudo com base nos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios de
2001 e 2005; 2007 www.ibge.gov.br
acessado em agosto de 2011.
Relatório da Organização Norte-americana de Direitos
Humanos Américas. Injustiça Criminal - A
Violência contra a Mulher no Brasil, Watch, 1992
KOLONTAI,
Alexandra. A Nova Mulher e a Moral
Sexual. Expressão Popular. 2008.
MARX,
Karl. O Capital: crítica da economia
política; o processo de produção do capital. 10.ª Ed. Livro I, Volume I.
São Paulo: DIFEL,1985.
Opinião
Socialista. 100 dias de governo Dilma...
e as greves operárias. N.422, 22 de
abril a 3 de maio de 2011. P. 9
__________O Sombrio quadro da Educação no Brasil. N.424, de 24 de maio a 7 de
junho de 2011. P.8 e 9.
__________ O
que é Machismo. n.419 de 3 a 22 de março de 2011. P. 07
STABILE, Carol A. Pós-modernismo, feminismo e Marx: notas do abismo. In:WOOD, Ellen
Meiksins; FOSTER, John Bellamy (Orgs.)Em
defesa da historia: marxismo e pós-modernismo. Rio de Janeiro:Jorge Zahar
Ed.,1999.,145-160
TOLEDO, Cecília. Mulheres: O gênero nos une, a classe nos divide. São Paulo:
Sundermann. 2008
TOLEDO,
Cecília. Afinal o que querem as mulheres? in:
Correio Internacional. n 4, p. 32 São Paulo, 2011
[1]Doutora
em Educação na UFRGS, profª da Rede Municipal de Porto Alegre/ Centro Municipal
de Educação dos Trabalhadores Paulo
Freire, pesquisadora da Linha de Pesquisa: Trabalho, Movimentos Sociais e
Educação-FACED/UFRGS. viero.anezia@gmailcom
[2] Acadêmica
de pós-graduação, em nível de Especialização, em História do Brasil
Contemporâneo (FAPA). E-mail: fabisanguine@hotmail.com.
[3]
Doutoranda em Educação na UFRGS, profª da Rede Municipal de Porto Alegre e da
Rede Estadual do Rio Grande do Sul, pesquisadora da Linha de Pesquisa: Trabalho,
Movimentos Sociais e Educação-FACED/UFRGS
soniaribassoares@hotmail.com
[4] (“Injustiça Criminal - A
Violência contra a Mulher no Brasil”, relatório da Organização Norte-americana
de Direitos Humanos Américas Watch, 1.992).
[5][5] Engels estuda os trabalhos do
inglês Lorimer Fison sobre as formas de matrimônios por grupos. (p. 56)

Nenhum comentário: