A
FORMAÇÃO POLÍTICA DAS MULHERES TRABALHADORAS NAS EXPERIÊNCIAS DE CLASSE
VIERO, Anésia.
SOARES, Sonia.
SANGUINÉ, Fabiana
Resumo: Este
artigo procura discutir as experiências de classe das mulheres trabalhadoras
nas organizações classistas, em especial na CUT, nos anos 1980, na Conlutas e
CSP - Conlutas, nos anos 2000. As experiências de classe das mulheres trabalhadoras
nas organizações de classe da visibilidade a luta contra a opressão e esta
fundamental para libertação da classe trabalhadora. O processo de fazer-se
classe por meio de experiências de classe é central no enfrentamento político
antagônico – classe contra classe, superando o caráter abstrato na luta dos
trabalhadores e o papel secundário das bandeiras feminista. A presença das lutas
das mulheres nas organizações classistas engendram um conteúdo político que
alteram o eixo das centrais, no que concerne a luta dos trabalhadores.
Palavras chaves – Formação Política, Experiência
de Classe, Organização Classista e Luta das Mulheres
Introdução
Este artigo procura discutir as experiências
de classe das mulheres trabalhadoras nas organizações classistas, em especial
na Central Única dos Trabalhadores – CUT, nos anos 1980, na Coordenação
Nacional de Lutas – Conlutas e Central Sindical e Popular Conlutas – CSP
Conlutas, nos anos 2000.
Tratar das experiências de classe das
mulheres na materialidade das organizações da classe trabalhadora é tratar da
mulher como sujeito político que luta pela sua libertação ao participar de espaços
como: associações, sindicatos, partidos políticos etc. É buscar compreender
como historicamente se materializa a especificidade da resistência da mulher a
opressão e a exploração. É compreender que a luta pela emancipação se dá no
fazer-se classe e nele é indispensável o enfrentamento político antagônico das
mulheres o qual se dá num espaço de relações sociais - classe contra classe - e
práticas culturais.
O
conjunto das relações de produção e das forças produtivas do modo de produção
capitalista distribui as pessoas em situações de classe que geram contradições
essenciais, conflitos de interesses e condições de luta. Logo a experiência de classe se manifesta tal
como assume as diferentes formas de resistência a opressão e a exploração, ao
mesmo tempo é o fazer-se classe da mulher que tenciona as fronteiras das
organizações da classe trabalhadora.
A
experiência de classe das mulheres trabalhadoras, em especial nas organizações
de classe, imprime na auto-organização da classe trabalhadora forma e conteúdo criativo,
envoltos num emaranhado de interações entre continuidade e mudança nas
organizações classistas, que ocorrem no terreno determinado e contraditório de
circunstâncias herdadas. (Wood 2003; Wilis 1996) A relação dialética das
mulheres na relação de classe, situada na materialidade histórica cultural são experienciadas
como novas, por cada geração, em especial, nos desdobramentos cotidianos da
existência-consciência das mulheres que atuam, tanto nos sindicatos, como nos
partidos e associações variadas.
As
determinações objetivas se colocam sobre seres históricos e culturais na medida
em que as mulheres “vivem” e “elaboram” formas de romper com situações de
opressão e exploração na sua prática política, nas organizações classistas. Dessa
forma elas materializam formas de romper com relações de mando-obediência (Viero,
2008) resultante de longas experiências no interior da cultura patriarcal que
alicerçou a história do Brasil tanto no mundo privado da família, como no mundo
público do trabalho e das organizações da classe trabalhadora, pela
naturalização da opressão formadora da subjetividade complexamente articulada
ao funcionamento da sociedade capitalista. (Soares, 2010; Viero, 2008)
As
organizações de classe são espaços possíveis de fazer a diferença na vida das
mulheres tanto privada como pública. Como espaço de luta e elaboração rompe com
o papel social conferido pela sociedade patriarcal à mulher. Nesses espaços
elas são sujeitos políticos, condição fundamental para romper com a divisão
entre atividade intelectual e manual, no momento que suas experiências de
classe abrem caminho para criarem formas próprias de resistência dentro das
organizações de classe, onde as mulheres defendem suas próprias teses. É
participando dos sindicatos, associações, partidos, que as mulheres criam
processos emancipatórios específicos e desenvolvem sua consciência de classe.
Nesse
sentido, a presença das mulheres nas organizações classistas engendra um
potencial político transformador, por meio da luta que expressa os problemas de
gênero. Ao transformar a natureza das organizações da classe trabalhadora com
sua prática política, as mulheres conferem o tom próprio no enfrentamento ao sistema
capitalista em que a dinâmica conflitual aparece como inacabada e aberta a
novas determinações. Á luta de classes se configura a partir de sujeitos reais e
o caráter abstrato dado a ela no momento que expressa às diversidades de
experiências, abre caminho para superar o caráter secundário dado a luta das
mulheres trabalhadoras. Assim a dinâmica de luta da classe trabalhadora se dá
de forma criativa, sendo necessária à organização desta classe, para fazer
frente ao sistema, visto que o capitalismo, ao mesmo tempo, que destrói as
diferenças ao nos tornar mercadoria, aproveita em benefício próprio, toda a
opressão que esteja histórica e culturalmente disponível.
As
práticas políticas que buscam a emancipação das mulheres não se dão isoladas dos
movimentos da classe trabalhadora para transformar a sociedade que oprime e explora
os seres humanos. Por meio da prática política as mulheres não só mudam a
natureza das organizações classistas como também mudam as experiências diárias
na família, no trabalho, na festa, em fim na totalidade de suas vidas.
1 - As experiências de classe e a mulher
Tratar
do fazer-se classe das mulheres trabalhadoras é tratar da participação das
mulheres nas experiências dos trabalhadores como classe. Nesse sentido a
organização da classe trabalhadora, autônoma do estado capitalista e das
empresas, passa pelos movimentos: sindical, popular e das opressões.
A
experiência em participar de movimentos que buscam unificar a luta classista
dos trabalhadores, é um espaço fundamental do fazer-se classe das mulheres
trabalhadoras. Ao mesmo tempo, que participando desses espaços as mulheres
tencionam a natureza desses movimentos.
Da
CUT dos anos 1980 para a Conlutas e CSP Conlutas dos anos 2000 tem diferenças
significativas em sua natureza que está relacionada à participação das
mulheres, dos negros, dos homossexuais. De Central Única dos Trabalhadores que
busca unificar a luta dos sindicatos autônomos do Estado capitalista e das
empresas passa a serem CONLUTAS e CSP CONLUTAS que buscam unificar as lutas dos
trabalhadores sindicalizados, do movimento popular e dos movimentos contra as
opressões (Mulheres, LGBT, Negros) e estudantes.
A natureza mais ampla da Central retrata como
as diferenças das experiências da classe trabalhadora agem no sentido de
ampliar as organizações da classe trabalhadora que se contrapõe fundamentadas
na conciliação de classe que contem as lutas dos trabalhadores dentro dos
limites do Estado capitalista.
Nossa
análise, como marxistas, busca compreender os espaços de participação das
mulheres trabalhadores como experiência de classe. Para isso consideramos a
base material que compunha a sociedade que define a posição que os indivíduos
ocupam nela. Porém a posição estrutural dos trabalhadores na sociedade não é
suficiente para compreender como os mesmos fazem-se como classe, num espaço de
relações sociais que os tratam como sujeitos reais.
Buscamos
a contribuição de Thompson (1987) pelo fato deste autor possibilitar a compreensão
dos fenômenos históricos sociais que tem lugar no processo de formação da
classe trabalhadora, em que a classe se faz por meio de um conjunto de relações
sociais e de práticas culturais mais ou menos comum. Sendo assim o fazer-se
classe não esta dada, ela constitui-se na trama histórica das relações, de
forma que classe não é abstração, mas uma relação composta por sujeitos concretos
e por meio de experiência comum que se reconhecem como membro da mesma.
Para
Thompson (1987)a experiência comum se dá por meio de determinações objetivas e
subjetivas. A formação da classe operária é inseparável do enfrentamento
político antagônico. A luta entre indivíduos opostos que se reconhecem por
experiências comuns dá a natureza política entre classes, onde a centralidade
está no embate político. Portanto, é por meio da prática que se dá o fazer-se
classe e a consciência de classe.
Segundo
o autor a experiência de classe, herdada e partilhada entre os indivíduos tanto
é determinada pelas relações de produção em que homens e mulheres nascem ou
entram involuntariamente, como pela experiência que se refere as práticas de
homens e mulheres envolvidos em relações produtivas determinadas. A experiência
de classe é a forma como essas práticas são tratadas pelos indivíduos em sua
cultura. Experiência de classe não se trata de práticas autônomas dos
indivíduos, mas se dá nas práticas dos indivíduos em relações sociais de
produção no tempo e são vividas a partir de um conjunto de valores culturais.
Sendo assim a determinação material é compreensível por meio da
ação-experiência-consciência de homens e mulheres concretos. A experiência e a
cultura evidenciam um sentido de tempo que realça a ação humana no processo
histórico, o sentido político das práticas culturais e das ações dos sujeitos.
A
classe é vista mediante a experiência dos sujeitos históricos. Logo experiência
e consciência são mediadas pelas práticas culturais das mulheres trabalhadoras.
Por isso o enfoque desse artigo na participação política das mulheres no
processo de formação da classe trabalhadora, no Brasil contemporâneo.
Para
analisar o fazer-se classe das mulheres trabalhadoras, situamos a “experiência”
como categoria mediadora na formação das organizações da classe trabalhadora. É
na experiência política vivida pelas mulheres que a consciência social gera a
“disposição de agir como classe” engendrando, portanto as particularidades
históricas e culturais específicas (Wood, 2003. 89). A experiência é vista como
mediação entre o ser social e a consciência social, em que o ser social
determina a consciência, que por sua vez é em si uma força material e assume
uma variedade de formas empíricas, historicamente específica, pois o processo
histórico intervém nas formas da consciência. Situações de classe das mulheres
criam diferentes formas de consciência. “Experiência,” então, se refere ao modo
como as mulheres vivem sua prática política, por que experienciam de forma
específica o modo de produção capitalista.
As relações de classe assumem diferentes formas,
válidas nas suas circunstâncias históricas como se manifestam nas experiências
vividas. É na experiência de classe que o processo de “experiência vivida”
assume a forma de “experiência percebida” formando a consciência de classe. A
constituição da “classe para si” é dada pelas interações e discussões das
experiências diárias e das interpretações dessas experiências. Por isso, pode
assumir tantas formas quanto for às configurações históricas no movimento da
classe trabalhadora. Nesse sentido, a distinção entre “classe em si” e “classe
para si” não é uma distinção analítica entre estrutura objetiva de classe e
consciência subjetiva de classe. Se refere a estágios no processo de formação
de classe, e em momentos históricos de relações entre estrutura e consciência,
em que “classe em si” diz respeito a “luta de classes sem classes”.(Thompson 1981/1987
e Wood. 2003)
Recorrer
a referência de Thompson é buscar um profundo senso de processo, identificando as
emaranhadas interações entre continuidade e mudança na luta de classes, em que
as relações de produção não aparecem como abstração, mas como um princípio
histórico operacional visível onde as práticas concretas da classe trabalhadora
são visível em sua luta.
Os
debates sobre os direitos das mulheres e as desigualdades entre sexo integra a
luta de classes e a pauta do projeto socialista ao longo da história. As mulheres
dos partidos socialistas e comunistas sempre colocaram o caráter político das
desigualdades de gênero, porém com a luta de classes sendo colocada de forma
abstrata, a diversidade dos sujeitos reais subsumiam na estrutura produtiva,
por isso a luta das mulheres assumiam um caráter secundário. (Martins, 1998)
O
caráter abstrato da luta dos trabalhadores deixa de fora os mecanismos
discriminatórios variados que se originam a partir de relações patriarcais,
materializadas no mando e obediência, relações essas fundamentais para o
capitalismo como sistema. Focar a experiência de classe das mulheres nas suas
práticas políticas, as relações de gênero e de classe, dão lugar a um senso
dinâmico em que ambas são tomadas na prática criativa da produção e reprodução
da vida material da história da classe trabalhadora, sendo fundamental para superar
o caráter abstrato da luta de classes.
O
caráter abstrato da luta dos trabalhadores acaba por produzir e reproduzir a
cultura do silêncio que se origina na cultura patriarcal, em que o patriarca
domina desde o escravo, o peão, agregado, o empregado até os filhos e a mulher.
São praticas culturais que se traduzem em formas simbólicas de dominação e
reprodução social herdadas, por isso a mudança na natureza das organizações de
classe criam possibilidades de enfrentar
essa praticas culturais e nesse sentido apontam alternativas de emancipação da
classe trabalhadora, que tem relação com a emancipação do ser humano. É nas
experiências de classe que as mulheres encontram forças necessárias para
superarem as práticas culturais que as tornam seres físicas e mentalmente mutiladas.(Viero, 2008; Soares, 2010)
A
produção em Marx envolve tanto a reprodução da vida, da espécie humana como a produção
social, sendo a última que determina à natureza da sociedade onde a reprodução
da vida fica historicamente destinada a mulher a qual envolve a procriação, o
cuidado com os filhos e o trabalho doméstico. Daí que as experiências comuns
das mulheres orientam os debates e as lutas feministas, que buscam questionar e
romper com o papel social colocado historicamente a ela.
Todavia
a natureza capitalista da sociedade confere a indistinção cada vez maior entre
esfera pública e privada. Por um lado o trabalho historicamente destinado a
mulher antes não mercantil tornam-se mais a condição de mercadoria num sentido mais
profundo, por outro lado as atividades intersubjetivas, da mulher passam a ser
articulada ao conceito de produção no momento que é absorvida no mundo fabril, segundo
pesquisas (Antunes, 2001) nas áreas de trabalhos mais intensivos, com níveis maiores
de precarização e exploração. Sendo assim a presença da mulher no mundo fabril desenha
nova forma de divisão sexual do trabalho, conferindo experiência comum entre as
mulheres no interior do mundo fabril.
Tem
sido experiência comum das mulheres, além de realizarem jornadas mais
prolongadas no plano público, são elas que continuam realizando as atividades domésticas
que consomem horas de sua vida privada, sendo duplamente exploradas pelo
capital. O trabalho das mulheres é parte
da necessidade do modo de produção, por isso, segue as regras da produção geral
de mercadorias.
Mesmo
com a visibilidade dessa experiência comum entre as mulheres só as organizações
mais recentes (Conlutas e CSP CONLUTAS) tem uma natureza sindical, popular e de
opressões. Embora a CUT tenha nascido nos anos 1980 quando o debate feminista
já era uma realidade no Brasil, tinha um caráter de luta sindical classista.
A
dicotomia natureza e cultura, classe e sexo: divisão entre sexo natural e
divisão de classe histórica continuava embasando a CUT. Por mais universal que
pudesse ser a causa feminista era considerada insuficiente como ação coletiva
incapaz de eliminar a economia e a política do capital. Somente os trabalhadores
teriam tal força. Essa análise coloca em primeira instância na ação política a
posição do sujeito na produção e não as experiências diferenciadas dentro da
produção. Nesse sentido a luta de classes não contempla as experiências de
classe dos trabalhadores e trabalhadoras. (Martins, 1998)
Porém
na história das lutas da classe trabalhadora as marxistas buscam romper com
abordagens dicotômicas, defenderam a imbricação histórica entre sexo e classe
como divisões sociais que se manifestavam como dominação e exploração sendo que
as experiências comuns das mulheres é sua história de opressão e exploração.
Assim a experiência de classe toma importância para a questão da mulher e as
análises de Thompson contribuem de forma significativa tornando visíveis os
sujeitos sociais subsumidos em agentes coletivos ou em estruturas. Abre espaço
para a análise histórica das relações sociais, “vista de baixo”.
O
foco dicotômico opressão - exploração passa a ser analisado e tratado nas lutas
da classe trabalhadora como relações de opressão, de exploração, de submissão, de
acomodação, de luta, de resistência. Complexifica-se as relações de poder entre
antagônicos. Assim rompe-se com os pares opostos opressor-oprimido ao
considerar a mulher, como sujeito da história, como sujeito político. A
história de luta da classe trabalhadora resgata a ação e a palavra da mulher,
fornecendo elementos não só da opressão, mas também da luta, da resistência
para sobrevivermos ao sistema opressor. São as reflexões sobre o caráter
político das relações de classe que contribuiu para tratar da história da
participação das mulheres na CUT anos 1980, na COLUTAS e CSP CONLUTAS anos 2000,
com ênfase na participação política das mulheres nessas organizações.
São
as mulheres marxistas que redesenham as organizações classistas, tensionado os
contornos da luta de classes, visto que a classe, como processo histórico, tem
diferenças internas que levam a experiências igualmente diversificadas. É a
presença das mulheres nas organizações classistas que contribui para romper com
a ideologia da domesticidade e o tratamento secundário da questão da mulher na
luta de classes. Por isso a importância do significado político da categoria
experiência de classe, pois as mulheres aparecem como ativistas políticas,
participando da sociedade, de clubes, de sindicatos, de partidos.
Nesse
artigo buscamos recolocar o significado da experiência das mulheres nas
organizações classistas quando consideramos que a experiência de classe não é
vivida igualmente pelos trabalhadores.
2 - O fazer-se classe das mulheres na
Central Única dos Trabalhadores dos anos 1980
A CUT é fundada em 1983 e faz parte do
processo de reorganização da sociedade brasileira, no pós ditadura. Logo a sua
fundação decorre do ascenso da luta da classe trabalhadora desde a década de
1970, como movimento que se organiza em torno dos sindicatos. Ela surge para
romper com a estrutura sindical, criada no governo de Vargas, nos anos do
Estado Novo e tem como objetivo mudar o rumo da estrutura sindical, ao mesmo
tempo, derrotar a ditadura militar. Com isso consolida-se como Central Sindical
combativa e representa o sindicalismo autônomo do estado e das empresas,
organizando lutas contra-hegemônicas dos trabalhadores no plano sindical e num
âmbito geral, tendo como tarefa histórica a ruptura da sociedade capitalista e
a construção socialista.
Nos anos 1990 a CUT passa por um processo de redefinição
de conteúdo das práticas de luta. De central, nos anos 1980, que unifica a luta
autônoma do Estado e das empresas numa luta classista, para a configuração da
CUT cidadã, nos anos 1990, que neutraliza esta perspectiva, confundindo o
movimento da classe trabalhadora e as instituições burguesas, numa relação de
conciliação de classes.
Desloca o eixo da organização dos
trabalhadores no confronto com o projeto capitalista de sociedade para a
predominância na negociação política no campo institucional, nos marcos dessa
sociedade, contribuindo de forma significativa para que os movimentos da classe
trabalhadora assumam uma posição de colaboração de classes. (Neves, 2005)
Assim lideranças sindicais ao fazerem parte de
uma experiência de classe reprodutora da lógica do capital, vivem em condições
materiais incompatível com os trabalhadores em geral, e atuam em instituições
burguesas (ministros do governo, Conselheiros do BNDS, administradores de
fundos de previdência complementar, das empresas estatais privatizadas) como
representantes dos trabalhadores, de fato, já não são mais e sim representam o
capital. Em decorrência acatam as diretrizes políticas do Banco Mundial e suas
orientações no que se refere à relação entre governo e sociedade no Brasil. (Oliveira,
2003)
Todavia o processo de revolucionar os
sindicatos com a natureza que a CUT assumiu manteve em sua essência a mesma
estrutura sindical, no momento em que a luta assume a forma abstrata no
fazer-se classe não considerando os sujeitos reais. As experiências sociais das
mulheres, dos negros e dos homossexuais subsumiram na prática política da CUT
como se o fazer-se classe fossem iguais e não houvessem situações de opressões
entre trabalhadores que resultam em diferentes experiências de classe. Este
processo abriu caminhos para afastar os trabalhadores do controle de sua
direção, resultando na manutenção do caráter burocrático da natureza dos sindicatos.
3- O
fazer-se classe das mulheres trabalhadoras na Conlutas e CSP Conlutas nos anos
2000
A partir da reorientação de rumos da CUT,
um setor da classe dos trabalhadores sindicalizados, rompem com a CUT. Desse
rompimento surgiu a Intersindical e a Conlutas, representando as
descontinuidades das mudanças que ocorrem no interior do movimento da classe
trabalhadora, resultantes das diferentes experiências da classe trabalhadora.
O
setor que rompe com a CUT funda a Intersindical buscando reconstruir uma
central sindical combativa aos moldes da CUT. A Conlutas por sua vez propõe organizar
uma Central de natureza Sindical, Popular e Social. Ambas buscam superar organizações da classe
trabalhadora que tem como princípio a colaboração de classes e retomar o caráter classistas do movimento dos trabalhadores que os
organizam tanto em torno das lutas
imediatas, como históricas.
Nossa análise está focada na Conlutas pela sua
natureza sindical, popular e social, sendo esse um passo significativo no
sentido de superar o caráter abstrato dado a luta da classe trabalhadora, no
momento que as diferentes experiências da classe trabalhadora aparecem de forma
organizada. Nas resoluções do Congresso
Nacional dos Trabalhadores – CONAT, Congresso de Fundação da Conlutas, em maio
de 2006 em Sumaré - São Paulo, consta que:
A
CONLUTAS e uma entidade de caráter classista que se constitui como instrumento
para a defesa das reivindicações, direitos e interesses da classe trabalhadora
em seu conjunto. Busca agrupar em seu interior os trabalhadores organizados nos
sindicatos, os desempregados, os aposentados, os trabalhadores que se organizam
nos diferentes movimentos populares e sociais da cidade e do campo, as
organizações e movimentos que lutam contra toda a forma de discriminação e
opressão, as organizações estudantis, as da juventude e outras afins, que
decidirem participar das lutas da classe trabalhadora.
Nas resoluções I Congresso da Conlutas realizado em julho
de 2008, em Betim - Minas Gerais, reafirma a natureza da Conlutas como uma
central sindical e popular:
A
Conlutas é uma organização de natureza sindical e popular, que organiza os
trabalhadores que estão no chamado mercado formal de trabalho, da cidade e do
campo, e que se organizam através dos sindicatos. Mas também aos desempregados,
aos precarizados, aos que estão na chamada economia informal, à legião de
“deserdados” da cidade e do campo, que se organizam em movimentos populares
urbanos e rurais de diversos tipos, bem como à juventude que se agrupam nas
organizações estudantis e movimentos sociais, como também as lutas contra a
opressão que atingem de forma diferenciada os setores da nossa classe, como é o
caso da luta contra o racismo, o machismo, a homofobia, etc.(...) Unir a todos
em uma luta de classe, contra o capitalismo e em defesa de uma sociedade
socialista.(...)
O papel da Conlutas não deve ser o de ditar regras e
formas de organização e de luta para cada setor. Devemos apoiar e impulsionar
os esforços de cada setor respeitando a sua autonomia e as escolhas de cada um
sobre como avançar em sua organização para a luta. Nosso esforço deve ser, sim,
o de dar um sentido comum à luta de todos, o sentido da luta da classe
trabalhadora contra a burguesia e o capitalismo.
Portanto, o respeito a especificidade não é
retórica, no momento que a estrutura da
Conlutas comporta as especificidades, sendo nelas onde se dá a elaboração das reivindicações.
Destacamos como as diferentes experiências da classe trabalhadora se organizam
em forma de Congressos específicos. Precedeu o Congresso da Conlutas no mesmo ano, o Congresso das Mulheres da
Conlutas. Nele as mulheres elaboraram suas reivindicações que são defendidas no
Congresso da Conlutas, que por sua vez reafirma as mesmas, as quais estão
expressas as diferenças das experiências da classe trabalhadora :
Pelo
fim da diferença salarial entre homens e mulheres, entre brancos (as) e negros
(as)(...) assim como o aumento dos salários de acordo com o aumento do custo de
vida.
Punição
às empresas que pagam salários diferenciados para a mesma função ou que fazem
exigência de “boa aparência” para contratação.
Incorporação
das bandeiras específicas das mulheres nas pautas de reivindicações dos
sindicatos.
Campanha
para a aprovação da lei que descriminaliza e legaliza o aborto no país e que
este procedimento seja feito em todos os hospitais públicos e pelos convênios
médicos com toda a segurança física e psicológica que garanta a segurança da
mulher.
Defesa
do direito a maternidade, com garantia de emprego, alimentação, salário digno (DIEESE),
creches, saúde e educação pública. Direito da mulher em optar pelo tipo de
parto, conforme as necessidades.
Impulsionar
uma campanha nacional de combate ao turismo sexual que tem como principal alvo
as mulheres negras. Campanha nacional da Conlutas para dar visibilidade à
mulher negra trabalhadora e das comunidades pobres.
Lançar
um movimento feminista da Conlutas, classista e socialista; um movimento das
mulheres trabalhadoras.
Considerando,
a crise do capitalismo, a precarização e a feminilização da força do trabalho e
que, portanto 50% da classe é composta por mulheres, na maioria negras, as
análises de conjuntura bem como as políticas da Conlutas precisam refletir esta
realidade (mulheres negras, negros e gays não devem ser pontos separados).
A diversidade da experiência da
classe trabalhadora que se organiza em torno da Conlutas se dá na especificidade
das mulheres lésbicas, as quais se organizam conforme sua experiência comum. As
lésbicas elaboram pauta de reivindicações a partir de suas experiências comuns,
assim expressas:
Que a Conlutas
encaminhe a construção de secretarias ou departamentos GLBT, de mulheres,
negros e negras nos seus sindicatos.
Elaborar um Plano de
lutas de combate à repressão racial, homofóbica contra a mulher e política de
cotas.
Unificar as
reivindicações imediatas dos setores GLBT, negros e mulheres, como necessidade
mais imediata.(...)
Temos plena
consciência de que as ideologias racistas, machistas e, particularmente, homofóbicas
estão disseminadas no conjunto do proletariado, contudo, queremos dar a batalha
para combater tais ideologias que nos dividem e enfraquecem, criando uma nova
cultura no movimento de massas brasileiro, (....)
O
processo de preparação para o Congresso da classe trabalhadora – CONCLAT em
Santos – SP em junho de 2010, que se traduz numa tentativa de unificação dos
diversos grupos que haviam rompido com a CUT (Intersindical e Conlutas) através
de debates em seminários e encontros dos diversos organismos como: sindicatos,
associações, grêmios, DCEs, discutiram amplamente a natureza de uma Central que
unificassem a classe trabalhadora.
Neste
processo se expressam as diferentes concepções, por um lado, uma concepção mais
abstrata da organização dos trabalhadores e por outro, uma concepção que trata
a classe trabalhadora em sua diversidade de experiência de classe. Este movimento
de preparação do CONCLAT garantiu o caráter social e popular reafirmando que a
organização deve expressar as diferenças dentro do movimento dos trabalhadores,
deste modo elaborando a política mais adequada para sua organização, por
exemplo, a sistematização em torno das questões de opressões. E neste sentido a
luta contra as opressões aparecerem de forma organizada, não estão mais
subsumidas nem secundarizada dentro do movimento dos trabalhadores, ao
contrário passam a serem consideradas fundamentais a sua superação no processo
de emancipação da classe trabalhadora e a construção de uma nova sociedade.
Na
Conlutas, o que ainda era a proposta, “Lançar um movimento feminista da
Conlutas, classista e socialista; um movimento das mulheres trabalhadoras”, na
CSP – Conlutas transforma-se em ação, através da fundação do MML – Movimento
Mulheres em Luta.
4 – Apontamento finais
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